quinta-feira, 11 de julho de 2019

O bolo do meu pai.


400 dias.

Passaram 400 dias desde que perdi o meu pai e ainda não estou preparada para falar aqui - ou onde quer que seja - de forma natural e "descontraída" sobre esta perda. Talvez nunca venha a estar. 

Quando comecei este blogue, já aqui o disse várias vezes, fi-lo porque tenho uma memória de galinha e queria registar acontecimentos, sobretudo relacionados com o crescimento de Caco Boy.

Apesar de ultimamente passar pouco por aqui (a culpa é do instagram, desde que abri página, aquilo tem sido um fartote), venho cá hoje porque quero fazer um registo. Portanto, uma vez que assumo que este post é mais para mim do que para vocês, considerai-vos livres para ir à vossa vida que tempo é dinheiro, não se deixa para amanhã o que se pode fazer hoje e coiso.

Ontem, enquanto preparava o quarto para deitar o meu filho, ele começou a chamar-me com insistência. Fui até à sala, onde estava a ver desenhos animados, saber o que queria de tão urgente. Para meu espanto, disse: "Mamã, o avô antes de ir para o céu podia ter deixado a receita dos bolinhos que nos fazia...".

Tentei fazer um ar natural, mas a verdade é que gelei por dentro. Esperava ouvir tudo menos aquela frase, até porque não havia razão nenhuma para se lembrar do avô naquele momento. Respondi que não fazia mal porque eu tinha guardado e não havia razão para se preocupar.

Desviei a conversa, com o pretexto que estava na hora de lavar os dentes, mas não conseguia parar de pensar como era possível que, aparentemente, eu já tivesse esquecido que o meu pai nos fazia bolos sempre que chegávamos sexta-feira à noite para passar o fim de semana. Era como se aquela memória - que para o meu filho representava talvez uma das recordações mais fortes do avô - tivesse desaparecido da minha cabeça.

Acho que os momentos tão cruéis que passei durante o fim de vida dele foram tão fortes que se sobrepuseram a estas memórias e também é por isso que quero deixar isto aqui escrito. Para nunca mais me  esquecer do cheiro a bolo que inundava a casa quando chegávamos e da cara de satisfação do meu pai quando via Caco Boy tão feliz por ver o bolo. 

Era um bolo simples, acho que assim meio parecido com o bolo de iogurte, mas era feito de Amor e igual a esse, mesmo que eu queira, não é possível comprar.

Nota: a foto não é do bolo do meu pai. É do blogue Lume Brando que escolhi propositadamente por ter a certeza que, tal como o bolo, também ele é feito com Amor.

16 comentários:

  1. A saudade existe para nos lembrar de momentos como esse. As recordações permanecem para sempre; o Amor com que se fazem as coisas marcam as pessoas. Ninguém morre, continuam a viver nas nossas lembranças.

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    1. Tudo isso é verdade, mas muito difícil de aceitar. Obrigada pelas palavras.

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  2. Se há coisa que nunca nos podem tirar, são as memórias e então as boas...não há hipótese, nem a morte as leva. Sei bem que é dificil de aceitar, infelizmente já passei por isso demasiadas vezes (pai, irmão) mas "agarra-te" às boas memórias, é assim que mantenho os meus anjos vivos. Um Xi gigante para ti

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  3. ♥️♥️♥️♥️♥️♥️♥️♥️♥️♥️
    Ainda guardo o cheiro (e o sabor)a sopa de couve branca, a arroz, a torradasde regueifa com manteiga e a leite com groselha da minha avó...

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    1. Leite com groselha? A tua avó já era uma modernaça! Que memória tão gira :-) Beijinhos

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  4. Desejo-te imenso amor nos dias que te sentires mais em baixo.
    with love, ♡

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    1. Ohhh, Catarina. Obrigada pelas tuas palavras. Beijinhos

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  5. Ei.....agora recordaste-me as memorias contraditórias que tive quando morreu a minha Mãe.....

    Também eu, passados uns meses acordei a pensar: "porra, deixei morrer a minha Mãe e nem lhe pedi a receita das Pataniscas de Bacalhau!".... (nota: deixei morrer, porque foi de cancro e não tinha solução e estivemos todos ali "à espera")

    Passei semanas e kilos de bacalhau a experimentar todas as formas e receitas até chegar ao mais parecido que consegui...

    E esforço-me para em determinadas datas cozinhar as especialidades dela, para que de alguma forma ela se mantenha connosco nessas alturas...

    Sei bem o quanto é difícil....

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    1. Acredita que sei bem o que queres dizer quando referes que estiveste à espera que a morte chegasse. Deve haver poucos sentimentos piores do que este. Muita força para lidar com esta dor com que teremos de conviver para sempre. Beijinhos

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  6. e pronto...fizeste-me chorar...vocês....pessoas reais....mexem comigo!!!

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  7. Memórias...uma boa que tenho é da sopa de peixe da minha avó Bia (Algarvia), com massinha cotovelinho, só ela sabia fazer, deixava pegar bem o refugado ao tachinho de aluminio (diz que mata!!!) e usava e abusava do colorau, o peixe era sempre bom...mas o toque dela nunca o soube dar....a memória ficou e todas as semanas faço uma massinha de peixe...prova de é boa e é para dar continuidade e quiçá um dia as minhas filhas tentarem também fazê-la parecida com a minha...porque lhes ficou na memória também.
    Marta Cabrita...a desconhecida que te acha uma piada do caraças!

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  8. Olá! Ao ler as suas palavras emocionei-me, pois perdi a minha mãe (já faz algum tempo, mas parece que foi ontem) e essas memórias de vez em quando assaltam-me e o mesmo acontece com o meu filho mais velho que tinha dois anos quando tal aconteceu...
    As memórias são o melhor que podemos guardar de quem partiu fisicamente... que continue a recordá-las sempre.

    Beijinhos.
    Sandra C.
    bluestrass.blogspot.com

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  9. Oh :') há coisas que nos marcam. Sejam elas um bolo, sejam elas um filhos que se lembra dos que amamos

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Deita cá para fora!