quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Obrigada, meu Amor.


Um dos principais propósitos da criação deste blogue foi registar recordações da evolução do meu filho, para que um dia a memória não me finte e eu acabe por deixar cair estes pequenos milagres no buraco do tempo.

Tenho 43 anos e estou na pior fase da minha vida. Sinto-me a morrer por dentro. Todos os dias. Nunca sei bem de onde vêm as forças para suportar. Sei que um dia isto vai ter um fim - até isso o tempo consegue - mas sei também que nunca mais trará de volta a pessoa que fui. Não sei se serei melhor, se serei pior, sei apenas que serei outra pessoa.

Mas vamos ao que interessa. 

Adormeço o meu filho todas as noites. A rotina era a habitual, a mais comum e que todos nós, pais, conhecemos.

De há uns tempos para cá, e quase sem me aperceber, mudou. Baby Caco passou a querer adormecer sempre da mesma maneira: deito-me ao lado dele, puxa a minha camisola de pijama para cima, o suficiente para poder encostar a cara dele à minha pele e fazer da minha barriga almofada. Às vezes lá fica um bocadinho de tecido à frente da pestana, mas ele vai com as mãozinhas e puxa-o de novo para cima para garantir que sente só a minha pele. Foi ele que assim decidiu e que tomou a iniciativa, sem nunca se falar muito no assunto. Um dia. Depois outro, e a seguir outro, até se ter tornado norma.

Entendo este gesto como um querer estar mais próximo de mim, da barriga de onde lhe lembro tantas vezes de onde saiu. Trocamos as frases de sempre que eu inicio e ele repete a seguir. Sempre de forma intercalada."Até amanhã, meu amor""Amo-te muito". "Daqui até à lua","A mamã vai tomar sempre conta de ti". Na última noite, já de olhos fechados e pela primeira vez, acrescentou: "Para tudo o que prechijar". Sim, meu filho, para tudo o que precisares. E ele fica ali o tempo suficiente, até os caracóis ficarem suados e a pele quase colada na minha, até a respiração ficar mais calma e eu perceber que finalmente adormeceu. Faço umas acrobacias para o colocar na posição normal, sem o acordar. 

É sempre assim que terminam os meu dias. No meio da angústia que me consome todas as horas, tenho este pedaço de céu ao cair da noite, que me lembra que ainda há motivos para continuar de pé e lutar. 

Deixo isto aqui registado para que um dia, quando te transformares num menino mais crescido, poder lembrar-me de te agradecer. Certamente nessa altura já me esqueci do suor dos teus caracóis colados na minha barriga, ou das palavras que trocávamos, mas quero poder lembrar-te da importância gigante que tiveste para eu continuar firme quando tudo parecia ruir. 

E se, mesmo assim, ainda perguntares:

- "Gigante como, mamã? Como o génio da lâmpada mágica?'.

- "Gigante como o amor que nos une".

- "Daquele que vai daqui até à lua?".

- "Sim, meu amor. Daquele que vai daqui até à lua".